A Pressão e a Responsabilidade dos Membros das Unidades de Controle Interno: Entre a Técnica e a Resistência Institucional

Até onde vai a pressão e onde começa a responsabilidade dos profissionais que atuam nas Unidades de Controle Interno e nas Controladorias municipais

Até onde vai a pressão e onde começa a responsabilidade dos profissionais que atuam nas Unidades de Controle Interno (UCCI) e nas Controladorias municipais? A trajetória dessas unidades, em especial nos municípios de pequeno e médio porte, é marcada por desafios estruturais, técnicos e institucionais, que comprometem não apenas a eficácia do controle, mas também a saúde mental e a integridade funcional de seus agentes.

É recorrente observar, nos relatórios de fiscalização externa, desde exigências de devolução de gratificações recebidas por membros da UCCI até críticas à ineficiência dos trabalhos desenvolvidos. Não raras vezes, os problemas se agravam pela precariedade das estruturas de controle, pela nomeação de servidores sem formação compatível, pela ausência de dedicação exclusiva, por legislações municipais defasadas ou pelo simples descaso com o planejamento estratégico da unidade.

Esse cenário adverso impõe a necessidade urgente de reposicionar as Unidades de Controle como engrenagens estratégicas da Administração Pública. Seu papel na prevenção de irregularidades, na promoção da eficiência e na defesa da integridade dos recursos públicos é essencial e inegociável.

Pressões Internas e Riscos Institucionais

Se os entraves estruturais já são grandes, os obstáculos internos podem ser ainda mais perversos. É comum que gestores pressionem diretamente os controladores, tentando influenciar relatórios, dificultar atividades ou até inviabilizar o exercício técnico das funções de controle interno.

Um caso emblemático ocorreu no Estado do Mato Grosso no ano de 2023, quando uma Câmara Municipal extinguiu o único cargo de controlador interno logo após a servidora denunciar irregularidades ao Ministério Público. A medida arbitrária foi “derrubada” judicialmente, com determinação de reintegração da profissional. Contudo, permanece a indagação: em que ambiente essa profissional trabalhará ao retornar?

Infelizmente, situações como essa não são isoladas. O controlador interno é, muitas vezes, alvo de retaliações, marginalização institucional e sobrecarga de tarefas. Isso afeta diretamente seu bem-estar e desempenho, podendo gerar quadros de estresse, esgotamento, ansiedade e até depressão.

Da Apatia à Eficiência: O Papel Transformador da Atuação Técnica

Quando há desmotivação, erros se multiplicam. A rotina se torna um fardo. A criatividade é substituída pelo conformismo. Ao final do expediente, resta o sentimento de que se poderia, e deveria, ter feito mais.

Desde a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2001, o contexto da gestão pública evoluiu consideravelmente. Exige-se, agora, uma atuação cada vez mais técnica, estratégica e alinhada aos princípios da Administração Pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Nesse ambiente, o fortalecimento institucional da fiscalização interna não é apenas desejável e sim indispensável.

Dez Práticas para fortalecer o Controle Interno Municipal

Para enfrentar as pressões cotidianas, elevar a qualidade do trabalho e evitar responsabilizações solidárias, destacam-se as seguintes recomendações:

  1. Revisar a legislação local: O arcabouço normativo deve oferecer respaldo e segurança aos profissionais de controle.

  2. Reavaliar periodicamente o Plano de Trabalho: Prioridades mudam. O planejamento deve ser dinâmico e estratégico.

  3. Dizer “não” com firmeza e respeito: A convivência com os fiscalizados exige habilidade relacional sem abrir mão da técnica.

  4. Manter diálogo aberto: Ambientes colaborativos são mais eficazes que relações estritamente formais.

  5. Ir além das obrigações legais: Inovar, diversificar e sair da rotina estimula a visão sistêmica e estratégica.

  6. Cumprir prazos e cobrar formalmente descumprimentos: A formalização evita omissões e protege juridicamente o controlador.

  7. Monitorar os apontamentos da fiscalização externa: Avaliar o cumprimento das recomendações dos Tribunais de Contas deve ser rotina de trabalho.

  8. Formalizar todas as ações: O que não está escrito, não existe. A atuação técnica exige registro e fundamentação.

  9. Estudar Acórdãos e precedentes dos Tribunais de Contas: Atualização constante qualifica decisões e reduz riscos.

  10. Atuar com rigor técnico e empatia: A abordagem punitiva pode ceder lugar a uma postura pedagógica e estratégica.

O Controle como Aliado da Boa Governança

Assumir o papel pedagógico é uma das formas mais eficazes de transformar a cultura do controle. Apontar falhas é importante, mas mais valioso ainda é orientar sobre como corrigi-las. Evitar uma linguagem punitiva e reconhecer que, em muitos casos, os erros decorrem de desconhecimento e não de má-fé, contribui para o fortalecimento da confiança institucional.

Quando o controlador interno conquista a confiança dos demais setores, deixa de ser visto como um obstáculo e passa a ser reconhecido como um parceiro da boa gestão.

É nesse ambiente de valorização e respeito mútuo que se constrói uma Administração Pública mais ética, técnica e eficiente.

Enfim, o enfrentamento das pressões institucionais e a valorização das Unidades de Controle Interno não devem ser uma pauta isolada ou episódica, mas uma agenda contínua da boa governança pública. A responsabilidade é grande, mas quando acompanhada de respaldo técnico, normativo e institucional, ela pode ser um poderoso instrumento de transformação do setor público.

Alexandre Wohlgemuth de Souza - Advogado, Especialista em Direito Público, Governo Digital e Licitações e Contratos.